CASA SIMON FAUSTO
(1961)

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    trecho de “Flávio arquiteto”
    Sérgio Ferro
    catálogo Flávio Império em cena
    1997, SESC, São Paulo
    Acervo Flávio Império

    © Sérgio Ferro

    Em 1961, Flávio construiu seu primeiro projeto importante, a residência Simon Fausto em Ubatuba. O uso franco e didático dos materiais, a ênfase do desenho dos componentes funcionais fundamentais, o uso de abóbadas catalãs mostram as influências cruzadas de Le Corbusier e Artigas. Mas há bem mais. A densidade espacial, por exemplo, aproveitando a experiência teatral nos exíguos palcos do Vergueiro,  do Cacilda Becker, do Arena. Não é maneirismo: por falta de verdadeira experimentação em arquitetura (o que ainda inexiste) nos acostumamos a utilizar os projetos para os amigos coniventes como ocasiões para testar procedimentos apropriados para o que nos parecia fundamental – casa e equipamento popular. O estudo da densidade fazia parte deste empenho.

    Não é hora ainda para comentário exaustivo das obras de Flávio: faltam pesquisas precisas, documentação completa, estudo comparativo metódico etc.  Mas quero só apontar um detalhe, dos mais belos, e que ilustra a complexidade do seu desenho. Como os altos-relevos de Le Corbusier em Marseille ou as jardineiras do Unity Temple de Frank Loyd Wright, a grande gárgula da fachada principal funciona como uma construção retórica complexa: um epílogo posto em posição de proêmio, de introdução. Espécie de objeto lógico, a calha corporifica o diagrama do escoamento das águas pluviais, varia com a variação dos espaços que sobrevoa, protegendo as janelas dos respingos nas jardineiras, deixando lugar para as gárgulas diretas no terraço, onde cilindros com pedregulhos não causam este inconveniente. Questões simples mas atendidas rigorosamente, como no resto do projeto. Mas o “objeto lógico” se inflama, cresce e escapa da pura serventia – e se faz canto do rigor. A calha é assim o sumário dos critérios de projetação, sumário que comove pela tensão entre o necessário e  o mais que necessário que a marca como um grifo. Verticalização da linguagem, como dizia Foucalt. Epílogo, portanto, (rerum repetito, posita in affectibus) – mas, posto na entrada, vira introdução: capta quem chega, dá logo as regras do jogo, encaminha uma leitura. O cenógrafo e o pintor, acostumados às manhas dos espaços significativos, assistem o arquiteto.

    SÉRGIO FERRO

    CASA SIMON FAUSTO
    (1961)