MORTE E VIDA SEVERINA
(1960)

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    Depoimento de Flávio Império a Fernanda Perracini Milani
    1975
    Acervo Flávio Império

    © Flávio Império

    Costumo falar dos meus primeiros trabalhos profissionais a partir de Morte e Vida Severina, de João Cabral de Melo Neto, montada pelo Teatro Experimental Cacilda Becker. Como o nome indica, o teatro experimental era uma variante do Teatro Cacilda Becker, uma espécie de teatro das segundas-feiras, pretendendo-se alternativo.

    Morte e Vida foi feito tipo realismo de minha cabeça misturado com a cabeça de Bertolt Brecht. Era a vontade de fazer um teatro cuja estética não fosse fechada. Um teatro onde houvesse projeção de slides, imagens que elucidassem os fatos, puxando-os para nossa realidade cotidiana. Um documentário, enfim. Uma coisa sobre o Nordeste feita com afetividade racional e lógica da poesia de João Cabral, interpretada pela cabeça poética, racional e lógica do paulista. Logo, acho que tinha mais coisas do que o universo do autor. O cara de teatro daquele tempo, 1960, achava que a cabeça de quem faz tinha direito de existência. Então se mostrava, adorava um certo exibicionismo, semelhante ao professor universitário que gosta de mostrar tudo o que sabe. Vaidade do saber, toda consumida nos anos 60, graças a Deus.

    O espetáculo, portanto, tinha muito de documentário informativo, como projeções de slides contendo dados sobre a imigração, sobre a chegada dos nordestinos à Estação do Norte etc. O Nordeste para a cabeça do paulista era uma tragédia nacional, uma chaga. O resto do corpo nos parecia sadio. Hoje, que somos a maior cidade nordestina, sabemos que o país todo é uma chaga, mas nem por isso existe morte.

    FLÁVIO IMPÉRIO

    MORTE E VIDA SEVERINA
    (1960)